Violência, mortes e doenças ainda afetam os Yanomami

9 agosto 2023

Avião sendo destruído em operação para retirada dos garimpeiros ilegais da Terra Indígena Yanomami. © Ibama

Seis meses após o governo iniciar a operação emergencial para remover os garimpeiros ilegais e reconhecer a crise humanitária na Terra Indígena Yanomami (RR-AM), os resultados são mistos: muitos indígenas continuam enfrentando o resultado de anos de invasão e violência. 

Três organizações Yanomami e Ye’kwana lançaram no dia 2 de agosto o relatório “Nós ainda estamos sofrendo”, que trata sobre os impactos da operação emergencial. Enquanto reconhecem o progresso feito, apontam o grave crescimento da insegurança em algumas regiões, devido à permanência de garimpeiros armados no território. O relatório também destaca o aumento exponencial da malária, desnutrição e doenças respiratórias que ainda estão tirando a vida de muitos indígenas.

O documento faz 33 recomendações e pede para as autoridades consultarem e trabalharem juntos dos povos Yanomami e Ye’kwana. Líderes Yanomami e Ye’kwana se reuniram em julho para discutir a situação, e anunciaram que “os resultados das ações realizadas até hoje estão longe de serem suficientes. Os garimpeiros continuam ingressando e destruindo nossa floresta. Ainda continuamos morrendo por falta de atendimento à saúde tanto dentro como fora de nosso território, quando nossos parentes são removidos e precisam passar muito tempo sofrendo na cidade.”

Garimpeiros ilegais são removidos da Terra Indígena Yanomami por agentes do IBAMA e da Polícia Federal. © Força Nacional Brasileira

O governo Bolsonaro ativamente encorajou e facilitou o garimpo ilegal em territórios indígenas; em 2022 mais de 60% da população Yanomami foi impactada pelo garimpo com consequências terríveis em sua saúde e modo de vida. A mineração na região é uma das grandes responsáveis pela propagação de malária, já que a larva do mosquito se reproduz na água parada das grandes crateras deixadas pelos garimpeiros.

A operação iniciada pelo governo Lula no começo de fevereiro estimava remover 25 mil garimpeiros ilegais. Obteve um progresso significativo e, no último mês, a ministra dos povos indígenas, Sonia Guajajara, declarou que 82% dos garimpeiros foram removidos do território.

Porém, um número significativo de garimpeiros armados e grupos criminosos persistem e resistem violentamente à retirada, ao mesmo tempo em que continuam extraindo ouro (escondendo equipamentos e trabalhando durante a noite para não serem detectados) e aterrorizando as comunidades. 

Garimpeiros ilegais foram vistos perto dos Moxihatatea (Yanomami isolados). Acima, uma imagem aérea das casas comunais dos Moxihatatea. © Guilherme Gnipper Trevisan/FUNAI/Hutukara

Uma operação em fevereiro destruiu uma área de garimpo muito próximo a uma comunidade de indígenas isolados, conhecidos como Moxihatëtëa, que estavam em perigo iminente de serem atacados pelos garimpeiros. O destino deles é desconhecido - uma fotografia aérea de sua grande yano (casa comunitária) mostra que está vazia, mas em boa condição. Qualquer contato entre eles e os garimpeiros pode ser fatal, já que eles não possuem imunidade a doenças comuns, como a gripe.

No começo de julho, uma criança Yanomami de cinco anos foi morta e vários Yanomami foram feridos quando garimpeiros atacaram uma comunidade na região de Parima. No dia 30 de abril, três Yanomami foram baleados por garimpeiros na comunidade de Uxiu – um morreu logo após o ataque.

Garimpeiros também atacaram agentes da Polícia Federal e do Ibama, resultando em morte em ambos os lados. Uma base de proteção em um dos principais rios que dá entrada ao território também foi atacada pelo menos cinco vezes desde sua abertura em fevereiro. 

Um dos muitos garimpos espalhados pela Terra Indígena Yanomami. © FUNAI

Apesar dos esforços do Ministério da Saúde, que construiu um hospital base de emergência no território, a saúde de indígenas de várias comunidades Yanomami e Ye’kwana continua crítica e eles continuam morrendo de doenças facilmente tratáveis.

De acordo com as autoridades, 157 Yanomami morreram desde janeiro - a maioria crianças de até quatro anos. Prevê-se que o número exato seja ainda maior por conta do grande número de mortes não notificadas. Crianças ainda estão sendo tratadas por desnutrição. 

A garantia de comida também é um grande problema – vários Yanomami ainda estão ou muito fracos por conta da malária e doenças respiratórias para cuidar de suas plantações e alimentar suas famílias, ou suas plantações foram destruídas por garimpeiros. Uma mulher Yanomami de Uxiu disse: “gente não tem saúde. Estão todos doentes. Estou triste porque mataram meus irmãos, estão todos magrinhos, com barriga grande. Na floresta não tem mais alimentos, porque a floresta está destruída”. 

Uma mulher Yanomami de Papiu explicou: “Os garimpeiros se instalam cada vez mais perto, por isso não conseguimos sair pra fazer farinha, buscar mandioca, ir pra roça, pelos garimpeiros estarem muito perto, não conseguimos andar. A malária se espalhou fortemente, está muito ruim”. 

A malária ainda é um problema e continua resultando em fatalidades. Os cuidados de saúde básicos não estão chegando nas comunidades mais remotas por falta de infraestrutura, fechamento de postos de saúde e profissionais da saúde com medo de sua segurança devido a garimpeiros ilegais armados ainda operando na região. 

Um estudo da Polícia Federal mostrou que os rios da Terra Indígena Yanomami estão altamente contaminados com mercúrio - 8.600% a mais do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde, e que Yanomami das 14 regiões do território possuem alto nível de contaminação por mercúrio.

Em resposta aos problemas levantados pelos Yanomami e Ye’kwana, a ministra dos povos indígenas disse que “reconhece que ainda há questões a serem resolvidas envolvendo a Terra Indígena Yanomami, mas a reconstrução dos estragos que foram feitos ao longo de anos de descaso leva algum tempo”.

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